sexta-feira, 29 de agosto de 2008

MORTE

Faleceu na semana passada a sogra da minha filha Ingrid. Foi um susto. Ela vinha há muitos anos com problemas cardíacos, motivados principalmente pela doença de Chagas. Tudo indica que morreu num sopro, sem grandes sofrimentos, como um passarinho (esta é uma expressão bem antiga).
O marido ficou muito chocado, quase sem controle, à beira de um processo depressivo. O filho, meu genro, instruído nos dogmas budistas, recebeu a notícia aparentemente mais calmo, mas no enterro demonstrou todo o sofrimento acumulado, sendo amparado pelos amigos.
Mas, o que deveríamos fazer neste momento? 10 mil anos de civilização, e outro tanto de estudos religiosos e filosóficos, ainda não nos ajudaram a encarar a morte como fenômeno natural. Sempre haverá aqueles que lamentarão profundamente a morte ocorrida, mesmo que anunciada, aqueles que lembrarão momentos significativos que passaram com a pessoa falecida, aqueles que farão projeções para o futuro dos sobreviventes, aqueles que lamentarão ter deixado pendências emocionais com ela, os que querem efetivamente se solidarizar, bem como os críticos, os hipócritas e os oportunistas.
Nos últimos dias, a morte tem se apresentado para mim, de modo bem nítido. Além da Dona Conceição e do falecimento de celebridades, soube pelo Orkut que nos deixaram uma antiga namorada (isso há 20 anos!) e uma grande amiga dos tempos da FAAP (há um ano).
Com todas, tive pendências. A Dona Conceição pretendia visitar o meu apartamento; não houve tempo para tanto. E eu nunca disse à minha ex, Rosa, e à minha amiga, a Noêmia, o quanto eu gostava delas e o quanto eu lamentava estar afastado delas.
Como me escreveu outro amigo da FAAP, o Renato Modernell, a vida é repleta de escolhas e nem sempre são as melhores.
O filósofo André Comte-Sponville, em seu livro Apresentação da Filosofia (Martins Fontes) escreve que ““Na morte, uns vêem uma salvação, que talvez alcancem, ou também, a expressão é de Platão, “um bom risco a correr”. Os outros, que não esperam nada, salvo o nada, vêem nela porém mais ou menos um descanso: o desaparecimento do cansaço. As duas idéias são amenas, ou podem ser. É para isso que a idéia da morte pode servir: para tornar a vida mais aceitável, por meio da esperança, ou mais insubstituível, por meio da unicidade. Em ambos os casos, mais uma razão para não a desperdiçar””. E ele finaliza “é preciso pensar a morte para amar melhor a vida – em todo o caso, para amá-la como ela é: frágil e passageira -, para apreciá-la melhor, para vivê-la melhor”.
Deixo vocês com essas penetrantes palavras.

OLIMPÍADAS

Foram duas semanas impactantes, para quem assistiu as competições, evidentemente. A China resolveu mostrar ao mundo o que pode fazer de melhor, em termos de tecnologia, organização e prática esportiva.
Os problemas do país, pobreza em muitas regiões, falta de liberdade de expressão, repressão a dissidentes e controle duro das minorias étnicas, foram bem “disfarçados”. Mesmo a poluição foi controlada por medidas extremas, como a quase proibição na circulação de veículos.
No Brasil, fomos obrigados mais uma vez a suportar as patriotadas. Muitos atletas, que conseguiram medalhas no último Pan e outros que se destacaram em mundiais e torneios posteriores, não conseguiram bons resultados em Pequim. Ora por nervosismo evidente, ora por incompetência no momento decisivo, ora pelo fato do adversário ter superado os seus limites.
Conseguimos nos manter ainda fortes no Vôlei, no Iatismo e no Judô (9 medalhas no total), fracassamos parcialmente no futebol (duas medalhas, mas sem o esperado ouro) e conseguimos feitos inéditos (medalhas na Natação, Atletismo e Taekwondo, quatro no total).
Nossos cronistas esportistas televisivos me angustiaram. Fora os erros de informação, normais numa cobertura tão extensa e alguns oriundos do total desconhecimento da cultura chinesa, se comportaram mais como torcedores do que jornalistas críticos. Era uma gritaria que muitas vezes não justificava o resultado obtido. Passei a assistir com a TV selecionada para mudo. Ora, muito jornalista depende que os esportes cresçam no Brasil, para garantir o seu emprego.
Como este País geralmente não aprofunda a discussão de seus problemas, tudo que for escrito nos próximos dias, elogios, críticas ou denúncias, ficará no vazio. O governo federal investiu muito em patrocínio de atletas, levou a maior delegação brasileira já vista em Olimpíadas, mas o próprio Lula considerou a participação brasileira como razoável.
Há muito tempo que os jogos olímpicos se tornaram vitrines políticas. No tempo da Guerra Fria, EUA, de um lado, e a URSS e seus países satélites se digladiavam em busca de medalhas. Depois, os países chamados livres se impuseram. Agora, foi a China que se esforçou por 8 anos seguidos para, em número de medalhas de ouro, superar os EUA. Internamente, esse fato reforçará o poder do Partido Comunista e sua política de socialismo capitalista.
Chovendo no molhado, porque vários especialistas já escreveram a respeito, o Brasil somente será uma potência esportiva quando tivermos saúde e educação de qualidade. Até lá, nos contentaremos em estar entre os 30 países mais medalhistas e suportarmos a mídia manipuladora.

MISÉRIA NACIONAL

Fiquei ensimesmado com duas reportagens publicadas recentemente, uma pelo Estadão (Férias Escolares Agravam Penúria, em 28/06/2008) e outra pela Folha de São Paulo (Bolsa Família “Perde” Para a Cesta Básica, de 29/06/2008). Demorei inclusive para escrever este texto, porque queira fugir dos preconceitos e estereótipos.
A matéria do Estadão focava uma dona de casa, Ana Cristina Souza, 31 anos de idade, mãe de cinco crianças e grávida da sexta. Ela recebe o Bolsa Família de R$ 112 e o marido ganha R$ 600 mensais, como ajudante de obra.
O tema da matéria era a situação difícil em que muitas famílias ficam, quando chegam as férias escolares. Nessa época, as despesas com alimentação aumentam, pois as crianças perdem o acesso à merenda escolar (lanche e almoço).
A Folha abordou que o valor da Bolsa Família, mesmo com o ajuste anunciado pelo Governo Federal, de 8%, continuaria defasado em relação ao valor da cesta básica.
Duas famílias de Pernambuco foram apresentadas no artigo, a de Sueli Dumont e a de Micinéia dos Santos, ambas com 36 anos de idade. Micinéia é mãe de três filhos, com 9, 8 e 6 anos de idade. Além da Bolsa Família, seu marido está plantando feijão para ajudar nas despesas de casa.
Sueli, por outro lado, recolhe garrafas PET em um lixão (ganha R$ 0,80 por saco), para por comida na mesa. Sua situação é crítica. Mãe de oito filhos, o mais novo com três anos de idade. Três das suas filhas já são mães adolescentes: a Kássia, 19 anos de idade, possui dois filhos, sua irmã gêmea, Késsia, estava grávida de 5 meses, e a Priscila, 16, também tem um filho. Na reportagem, todas aparecem sorridentes. A Kássia fez um curso de cabeleireira, pelo qual sua mãe recebeu ajuda estatal. Ao terminar, não arrumou emprego e, além disso, ficou viúva, pois o marido morreu afogado este ano.
Muitas vezes ouvi que desgraça pouca é bobagem. Mas, lendo essas matérias, baixou uma angústia, um desprezo pela cultura deste País, um asco em relação às políticas públicas.
Os governos anunciam que a vida no Brasil melhorou, que se formou uma nova classe média, consumidora. Mas, e os miseráveis? Não podemos abandoná-los à sua própria sorte e, nesse contexto, o Bolsa Família é uma ajuda aceitável. Porém, e o futuro? Onde está o compromisso dessas famílias com a responsabilidade social, com o bem estar geral de seus filhos? Continuarão a gerar mais miseráveis, sem perspectivas, a não ser a marginalidade social? Está passando a hora de um planejamento familiar mais rigoroso. Posso estar sendo simplista, mas não vejo esperanças para famílias como essas das matérias.